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sexta-feira, 29 de julho de 2011

Minha Pequena Crianca

Oi minha pequena crianca,
 
 
o que voce esta fazendo ai, debaixo desta escada escura?
- estou conversando com um anjo. Ele me entende como ninguem. Eu estou sempre sozinha, nao tem outras criancas com quem possa brincar, entao, para nao deixar minha tia nervosa eu fico aqui, queita, e o anjo vem conversar comigo. A gente passa horas brincando e fico sonhando... que tem muitas outras criancas brincando comigo...
fico aqui ate minha tia sentir falta de mim e sair pela casa me chamando, achando que estou aprontando alguma coisa. Entao, sem que ninguem perceba eu saio do meu esconderijo e me apresento para que ela me diga que esta na hora de comer alguma coisa, que vou comer mesmo sem fome... tenho medo dos seus olhos, eles faiscam, eles me impoe um vontade que nao é minha.
entao eu como e ela fica feliz e me deixa em paz. Eu converso com meu anjo e ele diz que eu tenha paciencia, que um dia tudo vai mudar.
ai chega meu tio e tenho que desaparecer novamente. Ele esta cansado e precisa dormir um pouco. Eu devo ficar em silencico para nao perturbar seu sono.
Vou para o meu quarto e fico la deitada tambem, olhando para o teto pois nao tenho sono... levanto devagar... aprendi a andar sem fazer barulho. Aprendi a desaparecer!
Tenho sonho de ganhar uma bicicleta no natal, mas isso nao aconteceu; meu pai morreu logo depois do natal... foi muito duro aquele natal de 1969. Eu perdi toda esperanca de ser levada pelo meu pai para a casa grande, onde eu podia brincar e onde existem outras criancas.
Vou continuar no meu canto, com meu anjo. Ele vai crescer e vamos mudar as brincadeiras...
Mas eu continuo desaparecendo de todos os lugares. Eu continuo me escondendo das pessoas, para nao incomodar.
Amizades, nenhuma serve para mim, segundo a avaliacao da minha tia, que fica aos gritos dentro de casa menosprezando minhas escolhas e para nao me envergonhar diante das amizades novas, eu as descarto, e volto para minha prisao, ao lado da tia, e vou crescendo...
Na escola tenho uma amiga, que logo desaparece ao termino do ano escolar e volto para a prisao.
Passo as ferias dentro de casa, procuro ler livros que nao existem.
Tenho obrigacao de ler cartas, documentos, processos, diario oficial,... sou a leitora oficial de tios analfabetos. Afinal eles estao se sacrificando para pagar meu colegio, e o minimo que posso fazer por gratidao é ler o que lhes interessa. Eles nao tem dinheiro para comprar outros livros pra mim, e os da escola, minha prima traz das editoras, todos respoondidos, pois sao livros do professor... e me criam problemas na escola, pois eu nao posso usa-los.
Roupas,... estas sao engracadas... usadas ou sao pequenas ou sao grandes. Eu me lembro de uma grande briga entre minha tia e meu pai por causa de um sapato para o colegio, que minha tia queria que meu pai pagasse. Eu nao sabia as condicoes de meu pai, e fiquei com pena dele e com raiva ao mesmo tempo. Ele comecou a tossir... escarrar... ficou nervoso e logo fomos embora.
Aquela raiva de meu pai foi sendo paulatinamente alimentada pela raiva transferida pelos meus tios. Eles estavam me criando com tanto sacrificio! E meu pai estava "nadando" em dinheiro... mas como? Ele estava doente e nao podia trabalhar.
Decidi desaparecer novamente.
Entrei para os livros. Assidua frequentadora da biblioteca do colegio, lia tudo que podia durante o intervalo das aulas... afinal eu nao tinha dinheiro para a merenda mesmo.
E tinha que agradecer muito estar estudando em um colegio particular, apesar da farda ser a mesma tres anos seguidos e aquele sapato que o papai me deu eu usei ate meus dedos ficarem dormentes dentro dele, pois meu pe cresceu e o sapato nao, para desespero total de minha tia.
Se hoje estou revelando todas estas coisas e sentimentos é so para que eles saiam de dentro de mim. Eu quero viver livre desse peso, dessas magoas, pois apesar de tudo nunca tive raiva de minha tia e sempre desejei para ela toda feliciadade possivel, assim como cuidei dela com carinho, mesmo nas horas mais estranhas. Relevei muitas coisas que depois eu conto.
 
Vou voltar para debaixo da escada e desaparecer.
 
Ate a proxima vez.

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